Artes Visuais

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

E por falar em Deleuze...

O primeiro livro de Deleuze que li foi "Conversações". Nele há tres trecho que destaco aqui pela razão exposta no texto anteror: são reflexõs filosóficas que me alimentam enquanto criador, enquanto poeta:

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Sim, existem sujeitos: são os grãos dançantes na poeira do visível, lugares móveis num murmúrio anônimo. O sujeito é sempre uma derivada. Ele nasce e se esvai na espessura do que se diz, do que se vê.

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É preciso falar da criação como traçando seu caminho entre impossibilidades. (…) A criação se faz em gargalos de estrangulamento. Mesmo numa língua dada uma nova sintaxe é uma língua estrangeira detro da língua. Se um criador não é agarrado pelo pescoço por um conjunto de impossibilidades, não é um criador. Um criador é alguém que cria suas próprias impossibilidades, e ao mesmo tempor cria um possível. É preciso lixar a parede, pois sem um conjunto de impossibilidadese não se terá essa linha de fuga, essa saída que constitui a criação, essa potência do falso que constitui a verdade. É preciso escrever líquido ou gasoso, justamente porque a percepção e a opinião ordinária são sólidas, geométricas. Nada de abandonar a terra. Mas tornar-se tanto mais terrestre quanto se inventa leis do líquido e do gasoso de que a terra depende. O estilo, então, tem necessidade de muito silêncio e trabalho para produzir um turbilhão no mesmo lugar, depois, lança-se como um fósforo que as crianças vão seguindo na água da sarjeta. Pois certamente não é compondo palavras, combinando frases, utilizando ideias que se faz um estilo. É preciso abrir as palavras, rachar as coisas, para que se liberem vetores que são os da terra. Todo escritor, todo criador é uma sombra. Como fazer a biografia de Proust ou Kafka? A partir do momento em que se escreve, a sombra é primeira em relação ao corpo. A verdade é da ordem da produção de existência. Não está dentro da cabeça, é algo que existe. O escritor emite corpos reais. No caso de Pessoa são personagens imaginários, não tão imaginários, porque ele lhes dá uma escrita, uma função. Mas ele sobretudo não faz, ele mesmo, o que os personagens fazem. Não se pode ir longe na literatura com o sistema "Viajamos e vimos muito", onde o autor primeiro faz as coisas e em seguida relata. O narcisismo dos autores é odioso porque não pode have narcisismo de uma sombra. Então a entrevista acabou. O que é grave, não é atravessar o deserto, tendo a idade e a paciência para isto; grave é para os jovens escritores que nascem no deserto, porque correm o risco de verem sua empreitada anulada antes mesmo que aconteça. E no entanto, é impossível que não nasça a nova raça de escritores que estão aí para os trabalhos e estilos.

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Acreditar no mundo é o que mais nos falta; nós perdemos completamente o mundo, nos desapossaram dele. Acreditar no mundo significa principalmente suscitar acontecimentos, mesmo pequenos, que escapem ao controle, ou engendrar novos espaços-tempos, mesmo de superfície ou volume reduzidos.
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Tradução de Peter Pál Pelbart

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