Artes Visuais

sábado, 12 de maio de 2012

Longa Metragem - Capítulo I


Longe Metragem

“O mundo começava nos seios de Jandira”
Jandira, Murilo Mendes

Descobri enquanto tentava decifrar as letras da edição francesa daquele livro de páginas amareladas, a única da biblioteca da cidade: o pedaço de revista caiu em meu colo procurando aconchego. Foto de perfil, lado esquerdo, mãos cobrindo o corpo seminu. Um pedaço de pele surgia preto e branco entre seus dedos magros. Fora o corpo de minha prima, que espiei diversas vezes enquanto ela se trocava, era a primeira vez que via a intimidade feminina tão exposta. O filme que Jandira protagonizava já estava saindo do Cine-Teatro Imperial. Chegou em agosto de 1967, com três meses de atraso, o que era normal então. Alguns amigos assistiram repetidas vezes e quando eu lhes perguntava como era, apenas balbuciavam o nome que ela usava: Camille Delacroix! Cabelos muito escuros, que contrastavam com a brancura de sua pele, naturalmente cinematográfica. Ainda que o filme fosse em cores, ela surgiria debaixo dos lençóis em tons de cinza. Não que isso a sombreasse, antes a diferenciava da realidade das outras mulheres de Itaponga do Norte ou de qualquer lugar do planeta. Era a nova estrela internacional, fizera apenas dois filmes tristes, mas cheios dela. Todos os continentes falavam de sua voz melódica, sua juventude, seus seios. Não eram os primeiros na história da arte que exercia, porém os mais poéticos. Sim, isso era o que diziam e eu concordava. Desejei vê-la, entrar escondido, mesmo o filme sendo proibido para menores: eu faria dezoito anos justamente quando o filme fosse embora da cidade. O recorte com a imagem de Camille foi, então, uma graça que eu soube reconhecer e guardar no mais íntimo segredo.

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