(4)
A casa era
um labirinto. O quintal todo cimentado aguardando um carro que nunca chegava
servia de abrigo à formigas, bicicletas e Senhorzinho, um pinscher desbotado
pelo tempo que mal se aguentava nas patas. Nas reminiscências de Murilo o cão
sempre esteve na casa e sempre fora velho. Como a avó. O tempo não passava na
casa embaraçada e o sofá de tijolos e cimentos que nunca mudava de lugar
atestava esta evidência. Casebre mal armado na adolescência de Lindalva, o
templo cresceu desenfreado conforme os casamentos familiares forçavam novos
cômodos. Um corredor que fazia curvas levava, para além da cozinha sempre
alaranjada, aos dois quartos da primeira geração. Logo se pensou em
verticalizar o dédalo, dispondo a família de parcos recursos mas variados
braços. No segundo patamar fez-se tortuosamente quarto para crianças, quarto
para dispensa, quarto para casais que amiúde habitavam e não a residência,
deixando reticências na narrativa familiar.
A casa era
um labirinto.
Tamanho
grupo era afeito à proporcional barulho. Festas de receber desconhecidos,
pedaços de carne dançando ao calor das brasas no churrasco. As cinzas dos dias
seguintes se enredavam por ruas e levava casa saúde assunto depressão
sobrenomes.
No fim só
ficou Lindalva, as plantas, o marido combalido e Senhorzinho. Visitas viraram
turismo de fim de ano.
O marido se
foi. As plantas secaram. As rugas quedaram os olhos. A vida se bestava na
norma.
Então
chegou o menino. Retardado, diziam os tios. Também pudera, amorteciam os primos
de graus já avançados, é pequeno, mas entende o que aconteceu. Eu fico com ele,
agarrou Lindalva. Ela também pouco de falar, não por aperto de palavras que em
verdade mal se guardavam na boca
(desconfiava da precisão destas, cuspia uma ou outra metáfora que era
sempre recebida como gracejo e angariada para ser retrabalhada em futuro
paladar frasístico; desejava ser sábia, mesmo com a séria desconfiança de que
não passaria de uma piadista, à sua revelia)
,entedia o
neto à medida em que se sabe que entender alguém é sentir-vibrar via afetos os
hábitos que fiam cada respiração. Murilo fazia suspiros que relatavam cada
ponto de seus pensares e isto bastava à Lindalva.
Acendia
velas sem saber para quais entidades enquanto o menino construía asas de cera
por instinto de sobrevivência.
A casa era
um labirinto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário